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De Einstein para Freud: Por que a guerra?

Em 1932, o Comitê Permanente para a Literatura e as Artes da Liga das Nações orientou o Instituto Internacional para Cooperação Intelectual a promover cartas entre intelectuais de renome “a respeito de assuntos destinados a servir aos interesses comuns à Liga das Nações e a vida intelectual”.
A Liga das Nações, ou Sociedade das Nações, criada ao término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) em função dos horrores vividos nesta, tem sede em Genebra, na Suíça, e foi a primeira organização de escopo universal em bases permanentes, voluntariamente integrada por Estados soberanos com o objetivo principal de instituir um sistema de segurança coletiva, promover a cooperação e assegurar a paz futura. Em abril de 1946, se dá formalmente a dissolução da Liga das Nações, que já não funcionava alguns anos antes.
Também, desde outubro de 1945 a Organização das Nações Unidas (ONU) já havia iniciado suas atividades, de forma a funcionar como sucessor da Liga das Nações.
Albert Einstein, a partir dessa promoção da Liga das Nações, em julho de 1932, envia uma carta-convite ao Professor Freud para dialogarem sobre: “Por que a guerra?”.
As duas cartas foram publicadas em Paris, em 1933, em alemão, francês e inglês simultaneamente, tendo sua circulação sido proibida na Alemanha.
Einstein, questionou e ponderou entre vários aspectos: “Existe alguma forma de livrar a humanidade da ameaça de guerra?”; “O que pode ser feito para proteger a humanidade da maldição da guerra?”; “É possível controlar a evolução da mente do homem, de modo a torna-lo à prova das psicoses do ódio e da destrutividade?”.
Em suas ponderações, Einstein se colocava um tanto otimista e acreditava que a partir da união das nações seria possível extrair a violência entre os homens e transportá-la para o campo da palavra.
A resposta de Freud ao Professor Einstein, em setembro de 1932, é mais pessimista porque ao recorrer aos conceitos psicanalíticos argumenta que a violência é algo próprio da constituição do ser humano. Introduziu, nesse “intercâmbio de ideias”, a violência se contrapondo em relação com o direito:
“O senhor começou com a relação entre o direito e o poder. Não se pode duvidar de que seja este o ponto de partida correto de nossa investigação. Mas, permita-me substituir a palavra ‘poder’ pela palavra mais nua e crua ‘violência’? Atualmente, direito e violência se nos afiguram como antíteses.”

A violência está arraigada junto à vida pulsional, ou seja, ela tem a ver com desejos, ambições, interesses e que, sendo assim, não pode ser eliminada/extirpada dos humanos. Escreve Freud: “...os conflitos de interesse entre os homens são resolvidos pelo uso da violência”.
A violência poderia ser suavizada, segundo Freud, quanto ao seu destino, ser tratada nas suas possibilidades de simbolização, mas não eliminada porque ela tem várias origens que constituem nossa subjetividade.
A destrutividade, argumenta Freud, compõe a preservação da vida dirigindo-se para fora e uma boa abordagem desse funcionamento, relacionado ao narcisismo, pode ser lida no artigo da colega Fabiana S. Pelliciari - https://www.triep.com.br/post/por-que-gostamos-tanto-de-ter-inimigos.
Finaliza Freud em reposta à Einstein:
Ora, a guerra se constitui na mais óbvia oposição à atitude psíquica que nos foi incutida pelo processo de civilização, e por esse motivo não podemos evitar de nos rebelar contra ela; simplesmente não podemos mais nos conformar com ela. Isto não é apenas um repúdio intelectual e emocional; nós, os pacifistas, temos uma intolerância constitucional à guerra, digamos, uma idiossincrasia exacerbada no mais alto grau. Realmente, parece que o rebaixamento dos padrões estéticos na guerra desempenha um papel dificilmente menor em nossa revolta do que as suas crueldades. E quanto tempo teremos de esperar até que o restante da humanidade também se torne pacifista? Não há como dizê-lo. Mas pode não ser utópico esperar que esses dois fatores, a atitude cultural e o justificado medo das consequências de uma guerra futura, venham a resultar, dentro de um tempo previsível, em que se ponha um término à ameaça de guerra. Por quais caminhos ou por que atalhos isto se realizará, não podemos adivinhar. Mas uma coisa podemos dizer: tudo o que estimula o crescimento da civilização trabalha simultaneamente contra a guerra.
Recomendo vivamente a leitura dessa correspondência, tão atual nacional e internacionalmente.
Referência Bibliográfica:
FREUD, Sigmund (1969) – Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas
Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago Ed. Ltda.
(1933 [1932]) Por que a guerra? Vol. XXII.

Daisy Maria Ramos Lino
Psicanalista, membro efetivo do TRIEP.
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