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Nosso melhor sorriso é mascarado

Atualizado: 6 de abr. de 2021



Nesse breve vídeo acima, em um minuto, Hitchcock explica o que é considerado por alguns como o “cinema puro”, a partir de uma técnica de edição conhecida como efeito Kuleshov.


No vídeo vemos um close de Hitchcock que corta para aquilo que ele vê, uma mãe com seu bebê nos braços, um novo corte volta para ele que sorri, sugerindo um senhor bondoso. Uma nova montagem é feita onde a parte da mulher com o bebê é retirada e trocada por uma garota de biquini, enquanto as outras partes são mantidas. Temos agora, ao ver o mesmo sorriso, a produção de um efeito de estarmos frente a um velho safado e não mais um suposto senhor bondoso.


É curioso pensar como uma boa atuação, a habilidade de uma expressão primorosa de um ator, seja também fruto de um contexto bem construído, pensar, também, como, numa narrativa estruturada com habilidade, a sequência como os fatos são apresentados pode mudar todo entendimento.


Por exemplo, uma cena de um close de gotas sendo colocadas em um copo de suco, poderia ser usada para criar o enredo de um filme sobre um medicamento ou sobre um veneno. Basta na sequência de imagens termos uma mãe cuidando de seu filho doente ou um corpo caído ao chão. E o mesmo sorriso pode ser usado para a mãe feliz, que cuida, como para uma mulher que envenena um personagem.


Outro aspecto que chama a atenção é nossa participação na significância produzida e o quanto ela diz de nós. Ao observar um senhor sorridente sem saber o que ele vê e enxergar ali um senhor bondoso ou um velho safado, evidencia o que foi “colocado em cena” por nós.



No momento atual, nosso cotidiano é atravessado pelo noticiário com o número de vítimas causadas pelo Covid-19. Essa semana a sequência desse enredo nos surpreendeu pelas imagens de uma celebração alegre, de sorrisos largos e sem máscaras na festa oferecida para 300 pessoas pela vitória política do senador Arthur Lira


Em meio à pandemia, a única vitória desses que deveriam nos representar e que se espera ser comemorada, seria a da competência em cuidar da saúde de toda população.


No atual contexto, não existe edição possível que faça essa alegria “cair bem” e se a sequência dessas cenas não produziu indignação e o efeito de que os sorrisos na festa eram de grandes canalhas, sugiro que corte para o noticiário de hoje e infelizmente veja os números de vítimas da Covid.


Você pode também escutar o conteúdo do texto.


Gustavo Florêncio Fernandes

Psicanalista, membro do TRIEP


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