Situação de emergência, calamidade pública, quarentena. No começo, alguns de nós, podemos ter feito planos de como preencher o tempo, executamos alguns, outros adiamos, como sempre. Podemos ter lembrado de algumas vivências, talvez para que a nostalgia nos assegurasse frente ao não sabido do momento em que estamos.

Mas, a quarentena foi renovada, o tempo passa e podemos nos sentir assustados. Ter medo, que é o que sentimos frente a algo específico, um objeto conhecido. Podemos temer a solidão, a perda da nossa rotina, perder o emprego, o poder aquisitivo...adoecer, perder pessoas do nosso convívio...morrer.
Podemos sentir angústia, sentimento difuso de quando sentimos algo estranho que mal conseguimos definir, a não ser como sensações no corpo. Insônia, peito apertado, falta de ar... será o “ Corona “ ??
“ Uma vez que um estado de ansiedade se estabelece, a ansiedade absorve todos os outros sentimentos...” nos lembra Lacan, o quê diz Freud em seu texto sobre o Pequeno Hans.
E ainda, esperando o quê virá, que não sabemos exatamente como virá e nem quando, podemos sentir terror, nos sentindo vulneráveis frente ao invisível, bicho estranho esse, que está no ar e que pode contaminar até quem mais entende do assunto!!
Destes sentimentos acima o melhor seria o medo, ele funciona como um alarme, algo nos ameaça, nos impacta, nos obriga a agir. Então ter medo da ameaça real que o Coronavírus apresenta pra nossa vida nos protege!
Frente a necessidade de isolamento social sofremos. Sentimos falta do convívio, dos encontros presenciais, dos toques... abraço, beijo ou aperto de mão ( lembro da brincadeira da infância! ) Alguns lutam, criticam ferozmente o confinamento, negam. Algumas de nossas dificuldades emocionais se justificam, agora, pelas impossibilidades.
Temos nossos sofrimentos, nossas dores subjetivas, sim, muito singulares, mas neste momento algo nos une. Reconhecemos que vivemos sob o mesmo desamparo, trazido pela possibilidade de adoecer ou mesmo morrer de um vírus que não tem vacina, nem mesmo remédio ainda! Acostumados a ter tudo num clique!
Também sofremos pelo o quê apareceu à céu aberto : somos todos humanos, seres constituídos pela linguagem, compartilhamos um código, vivemos sob um pacto social, até aí tudo bem, mas... qual é mesmo o pacto que fizemos na nossa sociedade contemporânea ? Todos são iguais... mas, uns mais iguais do que outros??
Sim, estamos todos nessa, todo mundo, o mundo todo. Frustração, privação e castração, as três “ caras “ da falta não cessam de se inscrever.
Compartilhamos nosso medo, nossas expectativas sobre o menor número de contágio, recuperação dos doentes, descoberta rápida de um tratamento e da vacina temos um sentimento de pertencimento a este mundo, estamos conectados numa ordem simbólica.
Estamos exatamente no intervalo entre o que não existe e o quê está por existir, a hiância, que nos lembra Lacan de vez em sempre. Então tratemos o medo, a angústia e o terror que pode nos acometer com o melhor destino que podemos dar à estes: pondo em palavras o quê sentimos, e, se possível, para um profissional que seja capacitado para tal escuta.

Patrícia Merli Macieira Matalani
Psicanalista, membro do TRIEP
macieiramatalani@uol.com.br
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