Em que pode a Psicanálise contribuir diante do sofrimento da criança, adolescentes e pais?
No final do século XIX e início do século XX, Freud com a Psicanálise abre um campo de investigação e introduz o conceito de inconsciente e assim, é possível um espaço de escuta para o sofrimento da criança e adolescente.
A Psicanálise, então, traz um novo discurso sobre o ser humano, não como indivíduo (objeto da ciência), mas como marcado pelo inconsciente, por essa “outra cena” ao mesmo tempo inquietante e familiar, um ser humano passível de sonhar, amar, desejar, construir crenças, odiar, culpar-se, etc...
Acompanhando muitos adolescentes, crianças e pais na clínica, escuto um sofrimento e uma angústia que se transformam num mal-estar na dinâmica familiar.
Se faz necessário pensarmos que o verdadeiro amor é aquele que também nos limita. Limita perante as falhas, as faltas e, principalmente, as frustrações.
Vivemos hoje numa sociedade onde nem adultos e nem crianças conseguem lidar com a frustração.
Constantemente ouço na clínica: “- Meu filho terá ou tem tudo aquilo que não tive”! Aí já se instala o grande pilar da frustação. Primeiro, por uma falsa ideia de que “o meu ideal, é o ideal do outro”, logo os pais super investem em seus filhos, projetando nestes seus próprios desejos outrora não realizados, faltas experimentadas durante suas infâncias ou outras etapas da vida pregressa.
Recebemos na clínica adolescentes super investidos, supostamente preparados para a vida adulta. Ouvimos dos pais, então: “- Demos os melhores colégios, apertamos orçamento, os melhores equipamentos, demos tudo o que podíamos e veja só, ele(a), quer jogar tudo fora”.
O que se esquece é que essa criança/adolescente, super investido, é outro Ser, um outro como outro diferente.
O que pode fazer a Psicanálise pelas crianças?
A clínica psicanalítica abre um espaço para essa criança falar sobre esse sofrimento, através do brincar, desenhar, criar histórias, fantasiar através de outros personagens e da confiança junto ao analista.
E para a família?
É no discurso deles que iremos entender a dinâmica familiar. E para os pais é muito importante que possam falar sobre seus próprios fantasmas, ressignificados e representados por este filho.
E no caso de adolescentes?
Iremos utilizar técnicas diferentes como relatos, desenho, tocar algum instrumento de sua escolha e até mesmo através de jogos, séries.
Ou seja, crianças, adolescentes e pais terão um lugar de fala e escuta.
De que sofrem os pais?
De seus próprios fantasmas (traumas), vivências da infância não elaboradas. Bem como, ideais (muitas vezes) frustrados que passam a ser projetados nos filhos de maneira inconsciente e que acabam por emergir através de angústias e sintomas. Sentimento de culpa por “investir e desejar” e, novamente, não se realizar.
Por fim, a pergunta que se fazem os pais: “- Onde foi que errei”?
Pergunta carregada de sofrimento e culpa. A resposta possível seria: não há erros ou acertos, apenas um investimento equivocado, num tempo e em um outro diferente que não é você!
Dar-se aqui a importância da escuta analítica para que toda a dinâmica familiar possa, de alguma forma, se modificar, talvez não eliminando ou zerando as angústias, mas tornando essa dinâmica menos sofrida para todos, entendendo que crianças e adolescentes podem ter um lugar de fala e importância na família e na sociedade.
Eunice Gabriel da Silva
Psicanalista, membro colaborador do TRIEP
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