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O humor e o poder

Nos últimos dias o humor esteve em destaque nas redes sociais, mas não o riso. Não é a primeira vez que isso ocorre, o que me faz ter a impressão de que essa frase introdutória seja provavelmente um plágio.



A excelente reportagem: “O que mais você quer, filha, para calar a boca? de João Batista Jr. para revista Piauí mostra em detalhes os abusos sofridos pela humorista Dani Calabresa por parte do também humorista Marcius Melhem. https://piaui.folha.uol.com.br/materia/o-que-mais-voce-quer-filha-para-calar-boca


Em determinados contextos o riso foi considerado profano, como mostra o romance de Umberto Eco, adaptado para o cinema, O Nome da Rosa. Sagrado era a sisudez. Sabemos que o humor critica e expõe diversos aspectos da sociedade desde sempre, contestando valores morais conservadores e falando do que estava censurado ou por vezes reforçando estereótipos sociais.


A figura do bufão, por exemplo, era contratada para fazer rir. Criticava a corte sem correr risco, suas palhaçadas tinham lugar especial frente ao tirano. O humor sempre tencionou os limites, dizendo aquilo que de outro modo poderia estar condenado ao silencio.


Na história narrada na revista Piauí podemos constatar como a lógica do “salve-se quem puder” não ajuda em nada a transformarmos nossa sociedade e suas estruturas de poder.


A reportagem deixa clara essa espécie de “blindagem” com que as instituições podem tratar uma figura de destaque dentro da “firma”. Colegas de trabalho evitando envolvimento, medidas brandas com a situação, tentativas de amenizar o caso. Punir sem expor, calar sem alarde. Foi preciso muita coragem, dessas que não se justifica depois dizendo que estava brincando, para se encontrar alguma justiça.


Freud tem um belo trabalho sobre o witz, traduzido por chiste, algo como uma tirada inteligente, que fala desse humor onde o riso surge no brincar com as palavras. Um tipo de humor comum hoje em dia em alguns memes e que sempre será entendido por determinados grupos que possuem traços em comum. O riso é a prova de que o chiste, a piada, funcionou.



Outra forma de humor seria o pastelão, onde alguém fica em posição de forte e o outro de fraco. O palhaço que chuta a bunda do outro que cai de cara no chão. Só quem ri é o forte ou aquele que se identificou com ele. Esse parece ser o lugar do assédio sexual. Alguém se valendo do seu lugar de poder para sadicamente abusar daquele em posição vulnerável.

Não podemos acabar com o sadismo no mundo, mas sua manifestação lúdica no desenho do Pica-pau, Tom e Jerry etc. me parece guardar algum lugar para o riso. Para manifestações sádicas que tratam o outro que não topou a brincadeira, como um objeto. Contamos com a lei, a punição e uma dose de tristeza.


Gustavo Florêncio Fernandes

Psicanalista, membro do TRIEP


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