A pergunta pode parecer meio absurda, porque muitos de nós dizemos detestar qualquer tipo de confusão. Mas às vezes tal confusão pode ser mascarada, quando falamos de pessoas que não gostamos apenas nas conversas com amigos, ou quando atacamos os outros de forma velada em perfis anônimos nas redes sociais, por exemplo. Mesmo porque, a internet pode ser de grande auxílio quando queremos expor nossas animosidades sem nos declararmos abertamente.
Um bom exemplo de como gostamos de situações de brigas, nem se for na pele de outras pessoas com as quais podemos nos identificar, é atestado pela audiência do Big Brother, que estava baixa até outro dia quando os seus participantes não se enfrentavam muito, mas começou a aumentar devido à intensificação das tretas entre os confinados. Quando se formam estes grupos rivais, começamos a nos identificar com esta ou aquela panelinha, estendendo nossas opiniões a respeito em discussões nas redes sociais. Sentimo-nos, dessa forma, pertencendo a um determinado grupo, mesmo que à distância.
Constatamos, assim, como gostamos de nos meter em conflitos, sejam eles declarados ou mais discretos. Podemos dar a cara à tapa ou deixar a nossa participação anônima. De qualquer forma, identificar nossos inimigos significa nos afirmarmos de um determinado jeito. Como isso acontece? Quando dizemos que não gostamos de alguém porque tal pessoa é invejosa, por exemplo, sabemos muito bem que essa é a sua característica, não há dúvidas! Em contrapartida, nos colocamos, muito provavelmente, como alguém bom ou, pelo menos, não invejoso. Retiramos tal aspecto que não gostamos de nós mesmos e o depositamos nos outros. Dizemos: “eu não tenho inveja, sou uma pessoa boa. Não sou como esse aí”.
O ódio ou a desavença nos traz essa certeza, porque delimitam muito bem os nossos inimigos ou adversários, pois sabemos contra quem nos contrapomos. Tal atitude pode ocorrer no âmbito da política, da vida social, dos esportes etc. Qualquer time de futebol é bem ilustrativo a esse respeito: um palmeirense não se mistura em nada com um corinthiano, e vice-versa. Cada um sabe muito bem o seu lugar porque delimita, igualmente, contra quem irá competir.
Criticamos nos outros o que não queremos para nós mesmos, pelo menos em um primeiro momento. Acontece que tal crítica pode nos fazer pensar: se digo que tal pessoa é invejosa, por que eu penso isso? Por que tal pessoa com determinada característica me afeta tanto?
Estas perguntas que fazemos a nós mesmos são importantes porque nos implica naquilo que nos queixamos nos outros. Mas vamos dizer que não queremos nos remeter às nossas próprias questões a partir do que os outros nos causam; queremos apenas apontar o dedo para os outros qualificando-os dos mais indesejáveis adjetivos: chatos, egoístas, maldosos, ingratos, e assim por diante. Em última instância, mantemos os nossos inimigos intactos, sem nenhum tipo de possibilidade de mudança. E, da mesma maneira, impossibilitamos reconhecer o que há de maldoso em nós mesmos. Afinal, sabemos exatamente quem somos, criaturas benevolentes e cheias de boas intenções! Será?
Afinal, pode ser realmente muito bom cultivar um inimigo de estimação pra chamar de seu.
Fabiana Sampaio Pellicciari
psicanalista membro efetivo do TRIEP
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