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Quando a cabeça não pensa, o corpo...

Adoecer é um fenômeno inerente à vida, mas não é só o corpo que sofre; ter angústia e ansiedade das mais variadas formas, perder o sono ou o apetite, faz parte do nosso viver.



Por vezes as dores se manifestam no corpo, outras na alma, e outras nos dois.


Acreditando que muitas doenças estejam ligadas ao funcionamento mental das pessoas, alguns cientistas na França se propuseram, há alguns anos, a estudar mulheres portadoras de nódulos nas mamas. O objetivo da pesquisa era verificar se havia alguma relação entre a malignidade do problema e o estado psicológico destas mulheres.


Sem os diagnósticos em mãos, as pacientes participaram de entrevistas que tinham o propósito de avaliar se suas vidas psíquicas contemplavam as capacidades de fantasiar e sonhar, o que são resultados das representações psíquicas que constituem a base da vida mental.


O resultado final desta pesquisa constatou que as mulheres que possuíam uma capacidade de representação psíquica mais preservada obtiveram diagnóstico de nódulos benignos.


Representação psíquica é um termo utilizado por Freud para designar a expressão psíquica das excitações provenientes do corpo. A todo instante, diferentes estímulos nos atingem produzindo algum nível de impacto, se este for significativo vai gerar um nível de tensão que demandará liberação, principalmente quando for intenso.


Essa liberação da tensão pode se dar por três vias não excludentes entre si: corporais (rubor no rosto; susto que leva a uma taquicardia; etc.), motora e sensorial (um estímulo ameaçador pode acarretar gritos ou tremores; etc.), mental ou psíquica (ativação dos pensamentos e ideias).


A capacidade de representação psíquica pode ser explicada, com um exemplo: diante de um estrondo muito forte, uma pessoa pode ter uma tremedeira, pode ter uma dor de barriga, pode correr e pode ao mesmo tempo em que tem essas reações corporais, motoras e sensoriais, pensar “o que foi esse barulho?”, “será um desmoronamento?”, mostrando assim que procura ou tenta dar um sentido para o que está experimentando. Claro que a pessoa pode dar sentido às experiências que vivencia posteriormente, quando pensa no que aconteceu ou fala sobre o ocorrido.


Então, se diante de uma situação da vida a pessoa reage somente pelas vias corporais e motoras podemos dizer que essa situação não foi representada psiquicamente, o que foi experienciado não foi processado no plano mental, ou seja, em pensamentos e ideias em busca de algum sentido.


Quando a pessoa não compreende o que se passa com seus afetos, não consegue mentalizar suas angústias, raivas e decepções, acaba correndo o risco de desenvolver sintomas somáticos, pois, podemos dizer que se encontra em uma linguagem pré-verbal.


Muitas vezes após vivenciar uma situação traumática, tal como desemprego, falência, perda de um ente querido, separação conjugal, mudança ou exílio forçado de país ou cidade, pandemia, guerra... pode ocorrer que o pensar desta pessoa fique diminuído em suas condições de fantasiar, sonhar, elaborar e processar suas angústias. Isso pode causar um rebaixamento de sua resistência física tornando seu corpo um terreno propício às doenças.


Portanto, o desequilíbrio da unidade corpo e mente pode produzir sintomas no corpo e acelerar o desenvolvimento de doenças.


Nas doenças psicossomáticas – como são chamadas - o corpo é afetado em sua realidade orgânica e funcional. Os episódios psicossomáticos, muitas vezes, são tratados por especialidades médicas que terminam por não levar em conta as múltiplas determinações e a complexidade de sentidos, desse modo não incluem o encaminhamento psicoterápico no tratamento destes pacientes.


A abordagem dos fenômenos psicossomáticos é complexa e não comporta visões unilaterais, sendo que a gravidade de certos casos exige olhares plurais sobre o sofrimento e requer encaminhamento psicoterapêutico.


O filósofo francês Régis Debray (2001) afirma que “separar nos indivíduos humanos o que atua na cena psíquica do que se vive ao nível do corpo é injustificado. De fato, a antiga dicotomia psique/soma não resiste a esta evidência: somos todos seres psicossomáticos”.


Daisy Maria Ramos Lino

Psicanalista, membro efetivo do TRIEP.


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