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"Tempo, tempo, tempo"

2023, se oficializa daqui vinte e três dias.

Comentários sobre a rapidez da passagem do ano anterior traz a ideia de que o tempo, traiçoeiramente, novamente nos pegou de surpresa. O tempo passa e deixa uma sensação que não deu tempo...



Como será a nossa relação com o tempo? A pressa não é mais inimiga da perfeição e devagar não se vai mais ao longe. Não temos mais tempo! Se tem a impressão que ou o dia deveria ser mais extenso ou não soubemos nos organizar. Preocupa-nos coisas como: vai demorar em aprender isso? A leitura do livro é demorada? Demora a fazer esta comida? Fazer terapia é demorado? Tem alguma coisa estranha nessa aceleração toda. A vida não é mais um percurso, mas uma correria.


O fenômeno característico da atualidade é a exagerada aceleração do cotidiano e a velocidade com a qual as alterações se processam. Nessa correria o urgente não deixa tempo para o importante, e temos daí um efeito colateral naquela que deveria ser a marca humana: a capacidade de reflexão e consciência. Essa capacidade, sob o efeito da correria, no esgotamento fica sem condição para persistir, combater, pensar e, assim, não evita o amortecimento dos sentidos e dos sonhos pessoais. Afinal, frente a verdadeiros ataques imperativos: tantas dietas, harmonizações faciais, muitas ordens da moda e do consumo com apelos insistentes da mídia; corpo e mente carecem cada dia mais, de horas de sono, de lazer e de sossego.


Vive-se de forma desesperada, ansiosamente. Por exemplo, na lógica de “aproveite a vida” não importa se para intensificar isso se consuma substâncias ou bebidas alcoólicas. “Aproveite a vida” pode até ser uma mensagem supostamente positiva, mas não se dá tempo para conhecer o outro. Não se conversa (conversar?), o negócio é “ficar” e daí o tempo “bem gasto” se mede pelo número de “ficadas”.


Freud em seu texto “Sobre a transitoriedade”, de 1914, fala do sentimento de inconformismo diante da constatação de que tudo está fadado à transitoriedade, a mortalidade, logo nossa própria existência está aí compreendida. A exigência de imortalidade, como produto do desejo, não pode reivindicar seu direito à realidade. No entanto, ela persiste no mundo mental como fruto da recusa do tempo.


Frente ao fenômeno da implacabilidade do tempo, faz-se “negociatas” com o imponderável e imagina-se que se pode burlar a falibilidade do corpo. E além das diversas buscas de intervenções no corpo para “parar” o tempo, a passagem do tempo impregna-se e encarna-se na imagem do outro que no envelhecimento torna-se descartável e é “trocado por duas (ou dois) de vinte”.



A problemática do tempo possui diversas faces e diversos graus de gravidade. Na neurose e em certos quadros de ansiedade o melhor é falarmos em uma “luta” contra o tempo. Mas o fato é que o fator tempo está no âmago da angústia humana em geral. É uma das suas agruras.


Ocupar o tempo da vida é inventar. E inventar pode ser refazer, recriar... como poeticamente diz Caetano em sua canção “Oração ao tempo”:


“E quando eu tiver saído para fora do teu círculo,

Tempo, tempo, tempo, tempo

Não serei nem terás sido

Tempo, tempo, tempo, tempo


Ainda assim acredito

Ser possível reunirmo-nos

Tempo, tempo, tempo, tempo

Num outro nível de vínculo

Tempo, tempo, tempo, tempo”



Daisy Lino

Psicanalista, membro efetivo do TRIEP

daisy_lino@hotmail.com


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