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  • Caetano em todos os lugares

    É conhecida a admiração de Freud pelos artistas, acreditava que teriam passado pelas questões que ele buscava esclarecer e teorizar antes dele. Com os anos da psicanálise fazendo parte da nossa cultura a via inversa também se realiza. Os artistas como todos nós, são interpelados pelas questões que existir como humano nos coloca. Vida e morte, de onde viemos, para onde vamos, nossos desejos, os obscuros, os proibidos etc. Eles buscam expressar, representar, aclarar, abstrair através de suas produções. Caetano Veloso eternizou Narciso ao lembrar que este acha feio o que não é espelho. É possível supor que ao escutarmos a canção (Sampa) a frase remeta cada um à sua maneira, a curiosa e difícil relação com o próprio narcisismo. Ao nos encontrarmos frente às diferenças, frente à expectativa que se frustra, ao que se impõe como diferença: a mente apavora, diz ele. Narciso, personagem da mitologia grega que Freud utiliza para falar sobre a constituição do Eu (sobre narcisismo sugiro também o artigo: www.triep.com.br/post/curar-se) e que podemos, a partir da frase da canção, dizer que somos mesmo sem perceber, remetidos ao narcisismo que nos constitui. Ao nos depararmos com aquilo que é diferente do que esperávamos, que não é espelho, sejam situações, pessoas, coisas às quais nos interessamos e nos ligamos. Em outra canção, diz que deseja o desejo do menino do Rio (“pois quando eu te vejo eu desejo o teu desejo”) ao vê-lo sonhando com as ondas, com o Havaí, com todos os lugares que supõe desejarem seu olhar, que “seja aqui”, traz ele. Podemos pensar que “aqui” seja o poeta em seu apaixonado deslumbre dando destino à tensão que flutua. Pode ser também o desejo de que se realizem os desejos desse menino. Desejar realizar o desejo do outro, tentar ter aquilo que se supõe ser o desejo do outro, na tentativa de sermos também desejados nos levam a águas que não refletem em espelho como na expectativa narcísica. O desejo sempre busca novas paradas e desencontros são certos. Os artistas são esses que nos convidam a rever e revisitar o mundo através de suas criações, emprestam seu olhar e nos ajudam a suportar as dificuldades da vida. Do tratamento psicanalítico espera-se que proporcione algo parecido àqueles que buscam esse caminho, no qual o paciente se descobre criador ao nomear aquilo que antes era silêncio e a achar novas maneiras de visitar sua própria história. Narcisismo e desejo são questões incontornáveis para todos e em especial para aqueles que se interessam em estudar psicanálise. Para estes recomendo os textos: Aos interessados em curso de psicanálise parte 1 e 2, da psicanalista Daisy Lino (www.triep.com.br/post/aos-interessados-em-curso-de-psicanalise e www.triep.com.br/post/aos-interessados-em-curso-de-psicanalise-parte-2) e o artigo da psicanalista Vera Iaconelli: Psicanalistas por atacado: a psicanálise tem gozado de enorme prestígio e popularização para o bem e para o mal, publicado na Folha de São Paulo em 8 de agosto de 2022. Gustavo Florêncio Fernandes Psicanalista, membro efetivo do TRIEP gusff@hotmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #gustavoflorenciofernandes #caetanoveloso#narcisimo #desejo#sampa#meninodorio #cursopsicanalise

  • Aos interessados em curso de Psicanálise - Parte 2

    Ao recebermos pedidos para a formação em psicanálise, vemos que algumas pessoas desconhecem completamente a importância de um processo de análise pessoal do candidato ao ofício de psicanalista. Entendem, alguns, que é só realizarem um curso, receber um certificado e pronto. Ou até acreditam que podem condicionar o início da análise pessoal se forem participar do curso. Se não forem participar, não vão buscar tratamento psicanalítico. Primeiro, é fundamental entender que a transmissão da Psicanálise não se sustenta no campo da aprendizagem comum. Em nosso artigo “Um curso ou um (per)curso”, escrevemos que: “nossa proposta de trabalho é a de caminhar numa espécie de “antimodelo” daquilo que habitualmente entendemos por curso. Queremos dizer que, os efeitos desse curso serão diferentes daqueles provocados pela pura comunicação do ensino tradicional...” Então, temos que entender que não estaremos no campo da aprendizagem tradicional e sim, no campo de uma experiência, ou seja, vamos absorver o que é transmitido de forma experiencial. A experiência da análise pessoal do psicanalista é a que possibilitará seu acesso ao próprio inconsciente e assim, se constitui um dos principais meios para seu percurso formativo. Pois, como escreve Freud, em seu artigo “As perspectivas futuras da terapêutica psicanalítica” (1910): “[...] notamos que nenhum psicanalista avança além do quanto permitem seus próprios complexos e resistências internas; e, em consequência, requeremos que ele deva iniciar sua atividade por uma autoanálise e leva-la, de modo contínuo, cada vez mais profundamente [...]” E ainda, constatamos a importância da análise do psicanalista, com o que segue Freud no artigo acima citado: “Qualquer um que falhe em produzir resultados numa autoanálise desse tipo deve desistir, imediatamente, de qualquer ideia de tornar-se capaz de tratar paciente pela análise.” (grifo meu). Há os que creem, sintomaticamente, que o estudo teórico da Psicanálise seria tal que atenderia também a compreensão psíquica de si mesmos. Sem dúvida, é preciso recorrer a um estudo teórico da teoria psicanalítica, base da formação, como também o estudo de outros campos do saber para esse percurso formativo. Porém, só o estudo ou conhecimento da teoria psicanalítica não será suficiente para a sua prática clínica e/ou conhecimento de si mesmo. Sandor Ferenczi, psicanalista húngaro, no seu texto “Elasticidade da técnica” (1928) escreve que: “[...] a segunda regra fundamental da psicanálise, isto é, quem quer analisar os outros deve, em primeiro lugar, ser ele próprio analisado.” Coloca, assim, a análise pessoal do analista como uma experiência necessária a ser vivida pelo psicanalista em formação. “Onde e como pode o pobre coitado adquirir aquela habilitação ideal, necessária em sua profissão? A resposta é: na própria análise, com a qual começa sua preparação para a sua atividade futura.” (FREUD, 1937, Análise finita e a infinita) Daisy Lino Psicanalista, membro efetivo do TRIEP daisy_lino@hotmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #daisylino #cursopsicanalise #eticadapsicanalise #analisepessoaldoanalista

  • Mesmo errado, eu estou certo!

    Vou propor um exercício de raciocínio a partir de um fato corriqueiro que possivelmente já aconteceu com cada um de nós. Trata-se de quando outras pessoas (ou nós mesmos) param o carro de tal modo a travar a saída de certos veículos que estavam estacionados corretamente, mas ofendem-se quando são chamados a atenção para sua infração. É como se pensassem “não vê que precisei parar só por um minuto?!”, indicando a justificativa para a atitude tomada: seja por tempo, dificuldade de estacionamento etc. Mostram-se, em última instância, indignados por terem sido apontados para o seu próprio erro. Este é somente um exemplo de situações nas quais o que está em questão é a inversão de quem está certo e de quem está errado: no caso, quem para o carro julga-se mal compreendido por quem lhe aponta o erro, como se pudesse reivindicar um lugar de exceção onde todos deveriam seguir as regras. Dessa forma, é como se o infrator se tornasse a pessoa correta da situação e o outro, que lhe chama a atenção, o errado. O importante nesse caso não é tanto a infração em si, mas a resposta em tom de ofensa dada pelo infrator, como se fosse o outro que devesse aguardar “um pouquinho” e não ele próprio que tivesse de sair com o seu carro do local proibido. É importante notar a diferença entre cometer algo errado tendo a consciência da falta cometida e, com isso, assumir a atitude equivocada, do que simplesmente inverter a situação ao se colocar como vítima da própria falha, como se o errado fosse o outro, aquele que aponta para quem está “fora da regra”, sendo justamente aí que reside a ofensa. Por que nos sentimos ofendidos pela indicação feita pelo outro sobre o nosso erro? Por que não nos responsabilizamos pelo nosso ato equivocado? Ao invés disso, podemos dar várias justificativas, como por exemplo, “não vê que eu estou sem tempo?” ou então “não há outro lugar para estacionar”, e assim por diante, indicando que nós somos especiais e não podemos, por uma série de intercorrências cotidianas comuns a todos os outros mortais, nos colocarmos como mais um dentre os demais. Porque se não há lugar para estacionar neste ponto que eu desejo, por que eu poderia dar um jeitinho e, ainda por cima, impor ao outro uma compreensão pela minha situação em particular? E sobretudo, por que não gosto de ser informado daquilo que eu estou errado? O desgosto parece se dar em um ponto específico: o outro me confirma que eu não tenho nada de especial que me faz destacar do restante da multidão, ao contrário do que eu gostaria de crer. Querendo ser uma exceção à regra, coloco-me a acreditar ocupar um lugar especial. E quem não quer? Mesmo errado, eu estou certo! Em quê? Certo em ocupar um lugar de destaque onde a regra não se aplica a mim, somente aos outros. Doce ilusão! Fabiana Sampaio Pellicciari psicanalista membro efetivo do TRIEP fabiana.pellicciari@gmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #fabianapellicciari #estoucerto #souespecial #excecao #ofensa

  • Divã: o de Procusto e o da Psicanálise

    A atemporalidade da narrativa dos mitos e lendas nos ajuda, muitas vezes, a compreender, pensar e ilustrar nossa própria história. E gosto de me referenciar neles para pensar algumas questões... Na região da antiga Grécia, em Ática, na estrada de Elêusis, vivia um criminoso bastante conhecido pelos métodos que infligia às vítimas que atacava. Com o intuito de assaltar aqueles que transitavam pelas estradas em que exercia sua “arte ilícita”, Procusto (como ficou conhecido) oferecia aos viajantes sua “hospitalidade”. A eles, oferecia para o descanso, um divã – uma cama de ferro com a justa medida de seu próprio corpo. Quando o viajante adormecia, Procusto dava início ao suplício: se o viajante fosse maior, partes de seu corpo lhe eram cortadas, os pés ou a cabeça, para “facilitar” a adequação. E se o viajante fosse menor, seu corpo era esticado a fim de caber no espaço a ele designado. Procusto usava a si mesmo como “a medida única para todas as coisas”. A isso chamava justiça... Sua aparente benevolência era um atrativo para as vítimas que, mais cedo ou mais tarde, para mais ou para menos, pagavam com seu próprio corpo. Talvez Procusto tenha sido, ainda que em termos mitológicos, um dos primeiros normatizadores de que se tem notícia. A lenda nos ajuda a compreender questões relativas à dificuldade em lidar com aquilo que escapa ao que é esperado como normal, padrão, adequado, comum, com aquilo que é diferente e foge a uma conhecida e determinada curva de normalidade ou de normatização do sujeito... O divã da psicanálise é bastante distinto do divã de Procusto. Opera em outra lógica. Em outro sentido. E está relacionado com a essência do saber psicanalítico que, desde suas construções iniciais, refere-se a uma espécie de crítica a qualquer tentativa de normalização, pedagogização e condicionamento, buscando compreender o que está para além ou aquém destas fronteiras e que diz respeito à subjetividade em sua pluralidade. O divã de Freud, um mobiliário azul com várias almofadas e um tapete aos pés, para que o paciente pudesse se aquecer e se aconchegar, foi presente de uma de suas pacientes, Madame Benvenisti (que após o término do tratamento, estava muito grata a Freud e quis concretizar esta gratidão, presenteando-o). A partir de então, o divã passou a fazer parte do cenário psicanalítico como um convite ao paciente para que, deitado, em contato mínimo com estímulos que possam “distraí-lo de si mesmo” e sem a interferência do olhar do analista, ele possa entregar-se à sua própria história e ajustar-se a um lugar (psíquico) que é somente seu. É este um dos objetivos da psicanálise que, como ferramenta de interlocução, possibilita que “o sujeito torne-se não conforme a norma, mas segundo ele mesmo” (Mannoni, 1991). E não em conformidade com algo que lhe é imposto de fora para dentro, mas de acordo com aquilo que ele se dá a conhecer de si mesmo, do que a cada um é possível fazer-saber de si. Assim, podemos dizer que numa experiência analítica, que não se reduz a uma tentativa de ortopedia ou engessamento psíquico, o sujeito experimenta o que seria uma travessia pela sua vida, enfrentando-se com a decepção, com a dor e com a perda de algumas ilusões, mas também podendo tomar conhecimento de suas possibilidades, de seus limites e suas responsabilidades. É nesse sentido que o divã na psicanálise propõe uma acolhida para aquele que se dispõe a esta viagem para o insólito e desconhecido de si mesmo. Mares calmos não serão garantidos, mas a parceria analista-analisando possibilita a navegação por estes mares talvez nunca dantes navegados... Leila Veratti Psicanalista, membro efetivo do TRIEP leilacsantos@hotmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #subjetividade #nodivã #procusto #leilaveratti #o_diva_a_passeio

  • O valor da moderação

    Coisa de dois meses assisti um show de Lia de Itamaracá, compositora e cantora de cirandas que está com 78 anos e segue a plenos pulmões. No início do show, sobe ao palco o apresentador do espetáculo, saúda todes, todas e todos e conta um pouco sobre ela. Após a primeira canção Lia segue com algumas passagens de sua vida. Dentre essas histórias, conta que a mãe, empregada doméstica, tinha em sua infância encontrado um “muito bom patrão”, que permitia que levasse ao trabalho seus oito filhos. Minha impressão é que essa colocação causou um certo desconforto no clima de bom humor que se fazia. Recentemente pude escutar a Elizabeth Roudinesco (historiadora e psicanalista francesa) falar sobre seu novo livro: O eu soberano, ensaio sobre as derivas identitárias. O debate que ela busca levantar (livro que ela diz ser difícil porque reivindica um lugar moderado e não extremista) se inicia ao ser recebida em Beirute, para um jantar onde o anfitrião a recebeu dizendo-se encantado em receber uma ortodoxa. Ela diz não ser ortodoxa, comenta sobre sua origem. Assim se inicia o livro tratando de questões sobre o estado laico, o narcisismo validado no mundo atual e sua incapacidade para a violência que se apresenta quando o outro é reconhecido como inimigo e sua diferença negada. Em sua fala ela lembra que essa divisão dos grupos cada vez com maiores especificidades podem ser levadas ao infinito. Mesmo que partindo de um lugar incontornável de importância o fenômeno leva a uma tensão com o que poderíamos reconhecer como uma subjetividade humana universal. Os grupos tendem ao radicalismo e ao aumento da violência. Em uma longa nota de rodapé, no texto “A concepção psicanalítica da perturbação psicogênica da visão” de 1910, na edição da Imago, o editor brasileiro recorta um trecho onde Freud explica que sempre repetiu que sua teoria apresenta o psiquismo tendo que lidar com conflitos, que no momento ele apresenta como pulsões sexuais e pulsões do Eu. Seria justamente por ignorar esse aspectos que alguns críticos o acusaram de um pansexualismo. Freud revê sua teoria em 1920 e os conflitos com o qual o aparelho psíquico teria que lidar serão atualizados em pulsão de vida e pulsão de morte. Em 1930, Freud no texto “0 mal-estar na civilização”, mostra como a civilização é custosa para nossos anseios mais radicais que não são pacíficos nem harmoniosos com as diferenças. Ao supor que a estranheza foi generalizada quando ouvi Lia dizer “bom patrão”, me deparo com a facilidade com que pude imaginar que todos faziam parte de um grupo uníssono e que perceberam a situação de forma similar a minha. Atravessados por um reconhecimento preconcebido e apressado, qualquer roda de conversa, qualquer ciranda, qualquer grupo, terá sempre que lidar com a tensão do individual e do coletivo de forma que, impossibilitados de uma realização plena de nossos anseios narcísicos, tenhamos que tornar possível a civilização em uma convivência dentro da fragilidade democrática e a resistência à pressão de grupos que almejam um totalitarismo. Gustavo Florêncio Fernandes Psicanalista, membro efetivo do TRIEP gusff@hotmail.com #psicanalise #psicanalisejundiai #triepjundiai #psicanalistasjundiai #triep #freud #gustavoflorenciofernandes #elisabethroudinesco #eusoberano

  • Aos interessados em curso de Psicanálise

    A psicanálise é uma prática terapêutica e não faz parte da Psicologia. É uma teoria, uma técnica e um método que permite a criação de um processo analítico no qual o sofrimento psíquico pode ser tratado. Em seu artigo A questão da análise leiga (1926), Freud na introdução esclarece que o termo leigo, do título, é igual a “não médico” e a questão é se aos não médicos seria possível exercer a psicanálise. Além de ser um artigo interessante para uma introdução à Psicanálise, nele vemos Freud elaborar a ética peculiar da sua ciência e o descolamento desta do campo da medicina, daí a expressão qualificadora de “leiga”. E qual seria essa ética peculiar? Seria a de que o psicanalista é aquele que se dispõe a acompanhar o encontro do sujeito com sua verdade respeitando sua singularidade. Que a análise busca oferecer ao analisando a possibilidade de se apropriar, ao dar forma e sentido, daquilo que se encontra silenciado, inarticulado, inacessível, confuso e é causa de sofrimentos e impasses. Que tem um caráter não pedagógico, onde a prática está em um campo oposto ao da “prescrição médica” ou de qualquer outro tipo de prescrição porque reconhecemos que o saber sobre si mesmo pertence ao próprio sujeito. Temos então, até aqui, a constatação de que essa ética peculiar não se encontrará simplesmente frequentando um curso de psicanálise. Há os que acreditam que seria somente um curso, e preferencialmente os mais rápidos, que imediatamente os habilitaria ao exercício clínico e pronto. Pronto? Não, o percurso para exercer o ofício de psicanalista é trabalhoso, difícil e, pasme, interminável. Esse percurso para ocupar o lugar de psicanalista implica, também, na ética da neutralidade, quer dizer, não decidir o destino daquele que o procurou, não determinar as escolhas de vida do outro, não se confundir com um conselheiro e muito menos com um “dono do saber e/ou verdade”. Não deve visar à adaptação do sujeito a padrões sociais e culturais e não prometer uma sucessão de dias felizes. “Mas onde e como esse coitado [o analista] deve adquirir a qualificação ideal que necessitará em sua atividade?” (Freud, Análise terminável e interminável, 1937) Principalmente, na sua análise pessoal. Será na travessia de sua análise pessoal que o analista poderá elaborar as condições psíquicas necessárias para evitar impor suas ideias e opiniões, manter uma posição receptiva, proporcionar ao analisando uma escuta isenta de julgamentos morais. Analista e analisando são feitos da mesma matéria – psique e corpo - e, a análise pessoal do analista o alerta para certos conteúdos e formas de funcionamento que lhe são peculiares e podem vir a ser obstáculos ao trabalho analítico. A atitude disponível, a atenção flutuante, seu conhecimento de si mesmo e da teoria psicanalítica, a capacidade de tolerar incertezas e dúvidas são “a qualificação ideal que necessitará” para o ofício de psicanalista. Em tempo, se você continua interessado em cursar Psicanálise leia um dos livros que a colega Leila Veratti indicou no artigo “As cartas de um percurso” – https://www.triep.com.br/post/as-cartas-de-um-percurso . Leia e vá em frente tendo em mente que a Psicanálise não é remédio para todos os males, ela pode mudar alguma coisa e essa “alguma coisa” pode ser essencial. Daisy Lino Psicanalista, membro efetivo do TRIEP daisy_lino@hotmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #daisylino #cursopsicanalise #eticadapsicanalise #analisepessoaldoanalista

  • Você quer mudar ou apenas parar de sofrer?

    É comum ouvirmos pessoas se queixando de seus sofrimentos dizendo quererem parar de sentir desconforto e angústia em relação ao casamento, no cuidado com os filhos, com os amigos, no ambiente de trabalho e assim por diante. Podem esperar, com o tratamento psicanalítico, que tal sofrimento cesse, aguardando do psicanalista respostas que possam lhes dar um tanto de conforto. Será que querem de fato mudar ou apenas parar de sofrer? Freud, no início da psicanálise, faz uma mudança crucial junto aos seus pacientes: ao invés de lhes oferecer respostas a partir de seu saber teórico, como era feito na época da hipnose pelos médicos, pede para que falem e associem livremente. Neste tipo de atitude, são os próprios pacientes que passam a encontrar as respostas que eles mesmos carregam, mas que ainda não sabem. Tal lugar ocupado por Freud possibilitou retirar os pacientes de uma postura passiva de esperar que “a cura” viesse do analista. Em suma, colocavam-se a trabalhar quando associavam livremente a partir do que eles próprios se queixavam, ao invés de esperar que uma solução milagrosa partisse do analista. Freud fazia perguntas em pontos-chave para a compreensão do que estava sendo dito pelos pacientes, em uma atitude de investigação e de interesse ao que eles lhes diziam, para daí poder interpretar a partir da própria história contada pelos pacientes. Tal atitude de espera por um saber que parta do analista e que diga o que a pessoa tenha que fazer se assemelha ao posicionamento que as crianças têm em relação aos seus pais: devotas do amor parental, aguardam deles respostas às suas inquietações, assegurando o seu lugar infantil onde o amor pode ter um caráter de “obediência crédula”, como diz Freud em seu texto Tratamento psíquico (ou anímico), em “relações amorosas plenas de dedicação” (p. 280). Um lugar subserviente e devoto, pode acabar silenciando o que de fato a pessoa quer falar. Este posicionamento pode persistir na vida adulta. Por isso, é importante que o paciente passe, cada vez mais, de tal atitude passiva de esperar que o saber esteja do lado do analista para uma postura ativa ao colocar-se a falar, fazendo as conexões necessárias para perceber em quais posições ele se encontra frente àquilo que ele próprio se queixa, mesmo que venha a descobrir o que antes não queria saber. Este é um processo que não ocorre sem algum tipo de sofrimento, já que sair de tal posição passiva e infantil não é agradável e sem resistências. Não é fácil mudar! Podemos preferir um lugar “confortável” onde sempre nos colocamos a esperar por aquilo que nos falta, sem nada fazer para alterar nada! Sem dúvida que há pacientes que se debruçam sobre suas questões e sustentam um tanto de desprazer inerente a qualquer processo de mudança, mesmo que este percurso seja repleto de momentos difíceis. Mas é preciso tempo e compromisso para seguir em frente, mesmo com os obstáculos. Segue a pergunta: você quer apenas parar de sofrer ou se propõe a mudar? Fabiana Sampaio Pellicciari psicanalista membro efetivo do TRIEP fabiana.pellicciari@gmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #fabianapellicciari #obstaculos #posicaoinfantil #sofrimento #mudança #decisao #Freud

  • As cartas de um percurso

    A formação do psicanalista ganha corpo a partir de sua análise pessoal, da supervisão de seus casos clínicos, do reconhecimento de seus pares e de seus estudos teóricos. Nesse percurso, a leitura é uma constante. Então hoje vamos de dicas de dois livros! Em "Cartas a um jovem terapeuta", Contardo Calligaris apresenta temas importantes para quem está iniciando seu percurso como (psico)terapeuta. No formato epistolar, responde cartas de dois supostos terapeutas iniciantes, apresentando suas dúvidas e inquietações ligadas, por exemplo, à chegada do primeiro paciente; o que precisaria ser feito para ter mais pacientes; o que pensar sobre situações nas quais o paciente nos causa irritação ou nos dá sono; quais seriam as características (técnicas e humanas) importantes para aquele que pretende se tornar um psicoterapeuta... Apresenta questões relacionadas ao diálogo da psicanálise com outras ciências, suas especificidades, bem como o conflito entre elas. Destaca conceitos teóricos e técnicos, de uma maneira fluída, como quem considera e aconselha um terapeuta iniciante, esteja este interessado ou não, especificamente, na psicanálise, embora seu referencial parta daí. Já o livro "Cartas a uma jovem psicanalista", de Heitor O'Dwyer de Macedo, embora apresente o mesmo formato, percorre um caminho mais específico. Ligando sua escrita mais diretamente à Psicanálise, o autor relaciona algumas teorias à prática analítica, apresentando ricas vinhetas clínicas e apontando questões bastante comuns, "respondidas" a partir de sua experiência como psicanalista. Afirma a importância de um posicionamento ético do analista, acreditando que este não se constitui sem considerar o encontro do analista com seus autores de referência e a experiência de sua própria análise. Ao falar de seu processo de Formação, homenageia seus Mestres e conta sobre as heranças recebidas de cada um e a maneira como de como se apropriou delas, citando Françoise Dolto, Sándor Ferenczi, Piera Aulagnier, Joyce McDougall, Donald Winnicott... Ao "responder" às cartas, estabelece um diálogo não só com a jovem psicanalista ficcional, mas também com seus pares. Retoma compreensões de textos freudianos, apresentando posicionamentos próprios e reservando lugar especial ao que considera primordial ao processo e trabalho analítico: a presença da alegria e do humor, necessários ao trabalho de um "analista vivo", capaz de um trabalho de escuta e de reflexividade junto a seu paciente. “Cartas a um jovem terapeuta” e “Cartas a uma jovem psicanalista” são leituras que fazem pensar diferentes momentos de um processo de Formação, destacando importantes conceitos e teorizações psicanalíticas. Vale conferir! Leila Veratti Psicanalista, membro efetivo do TRIEP leilacsantos@hotmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #dicadelivros #psicanalise #clinicapsicanalitica #formacaocontinuada #leilaveratti #o_diva_a_passeio

  • Um CURSO ou Um (PER)CURSO?

    Em se tratando de Psicanálise, cabe esclarecermos que apesar da nomeação – Curso de Formação – nossa proposta de trabalho é a de caminhar numa espécie de “antimodelo” daquilo que habitualmente entendemos por curso. Queremos dizer que, os efeitos desse curso serão diferentes daqueles provocados pela pura comunicação do ensino tradicional, concebido de forma a separar o professor “sabe tudo” do aluno “que não sabe nada”. Portanto, em relação ao texto fundador, estaremos em constante diálogo e apropriação de um saber na contramão do estudo formal. Buscando refazer o percurso das descobertas freudianas, tentaremos mobilizar as condições para o movimento de descobrir próprio de cada um. Nesse trânsito da construção teórica freudiana, do surgimento das problemáticas, dos conceitos e do seu método, acreditamos precioso adquirir o lugar de valor ao precisar as perguntas que Freud formulou, mais do que suas respostas. Experimentaremos, assim, dia após dia: dúvidas; formulações; reformulações; leituras e releituras no itinerário dos nossos questionamentos e descobertas. Nossos estudos não serão “simples” leituras, muito menos um “dever de casa”, mas uma busca marcada pela inquietude, angústia e questionamento ativo do desejo de saber. Entendemos que o vínculo que cada um tem com a teoria fornecerá pistas sobre o vínculo que terá com sua prática clínica. Trata-se, então, da escolha de um projeto - o percurso na psicanálise - que implica, entre outras coisas, em: uma particular relação com o saber, isto é, com o desejo de saber sobre o desejo dos outros. “Para começar, direi que não se trata de uma dificuldade intelectual, de algo que torne a psicanálise difícil de ser entendida pelo ouvinte ou pelo leitor, mas de uma dificuldade afetiva (grifo nosso) – alguma coisa que aliena os sentimentos daqueles que entram em contato com a psicanálise, de tal forma que os deixa menos inclinados a acreditar nela ou a interessar-se por ela”.[1] Neste artigo, como em outros, Freud nos instiga a perguntar: o quanto é fundamental, em todos os sentidos, que a análise exista na escolha desse projeto - percurso? O eixo privilegiado na formação de um analista é a análise pessoal. É o único lugar aonde se pode analisar o desejo de ser analista, a relação com o saber, e ascender a uma condição psíquica na qual a curiosidade sexual infantil foi subtraída a um processo que encaminhou à sublimação. Lugar privilegiado da experiência da transferência e do inconsciente. Podemos concluir, a partir dessa citação de Freud que, certamente, fazer análise e analisar nos coloca, em relação ao estudo da teoria psicanalítica numa possibilidade de diálogo e apropriação diferentes do que nomeamos acima de estudo formal. Deste modo, o aprendizado não é uma abstração, mas seu valor pode ser checado pela prática e pela própria análise, na superação da resistência dos nossos “pontos cegos”. É necessário vencer a resistência e não a ignorância, ao preço de vários tormentos, é verdade! Pensamos, então, que cada um escolhe, pelo livre arbítrio, seu analista, para se aventurar num processo de viagem “ao estrangeiro” (J. Laplanche) em si. E assim, não encontrando na questão profissional uma rota de fuga para a dor na transferência, ou ainda, a tentação de colocar a teoria ao serviço, perigoso e perverso, de se defender das angústias da prática clínica. Em termos temporais, o estudo da teoria psicanalítica não se encerra nesses dois anos e meio da nossa proposta, ao contrário, desde já, deve ser considerado por todos como não tendo um ponto final, por estar sempre em perpétua atualização. Por fim, para completar o tripé da formação – análise pessoal, estudo da teoria psicanalítica temos, também, a supervisão da prática clínica. Diante do discurso do seu paciente, que interpela sua escuta, o analista iniciante é confrontado com um supervisor que interrogará sua escuta desde um saber que lhe é atribuído. Consideramos que aprender psicanálise não é, apenas, abstrair conceitos dos textos discutidos, mas resignificá-los e valorizá-los a partir da clínica, da análise pessoal e da supervisão. Apropriar-se do texto psicanalítico atravessa a singularidade da história de cada um de nós, assim como, revela nossa identificação com Freud. “A formação em psicanálise é um trabalho interior contínuo, que não se encerra com um curso, não se legitima com um diploma e não termina jamais. O saber sobre o inconsciente tem sempre um ‘mais, ainda’...”, como bem diz o psicanalista Geraldino Alves Ferreira Netto. [1] Freud, S. Uma dificuldade no caminho da psicanálise (1917). S.E. –1969- Vol. XVII, pág. 171. (Artigo originalmente publicado em 09/07/2020) Psicanalistas membros efetivos do TRIEP triepjundiai@gmail.com #psicanalise #psicanalisejundiai #formaçãoempsicanalise #freud #tripédaformação #percursoempsicanálise #desejodesaber #tripedaformação #analisepessoal #cursoformaçãotriep2021 <VOLTAR

  • Violência e Responsabilidade

    Retomo aqui uma temática que escrevi em dezembro/2020 - https://www.triep.com.br/post/a-outra-face-humana Um homem morreu asfixiado no carro da polícia rodoviária federal pela ação de uma bomba de gás lacrimogênio lançada pelos policiais; um andarilho matou dois policiais a tiros após tomar suas próprias armas; pessoas apanham e são assaltadas em arrastões nas ruas... E no mundo temos guerra, destruição e mortes em massa. Crimes sórdidos, além de outras formas de violência: falta de cidadania, perda da solidariedade, desvalorizações do próximo, pessoal ou virtualmente nas redes sociais. Sem falar da violência da política, onde se faz vários tipos de desvios para desfrutes e enriquecimentos pessoais. Na maioria das vezes reconhecemos a violência como um problema externo e, quando atingidos, falamos dela como eventuais vítimas inocentes. É difícil pensar que nós mesmos podemos ser direta ou indiretamente produtores de violência. Um fenômeno do porte da violência é de tal complexidade que seria muito difícil abarcá-lo como um todo. A violência é fruto de uma história de relações humanas, de frustrações, de conflitos. Por isso, é preciso refletir de que forma as precárias condições de habitação, saúde, educação e inclusão social atuam na dinâmica das relações; qual o lugar que o espaço habitado ou a cidade em que vivemos ocupa na construção de nossa identidade. A elevada mortalidade e morbidade por violência no Brasil não pode ser compreendido integralmente, sem que se lance mão de determinados termos e conceitos como desigualdade, injustiça, corrupção, impunidade, deterioração institucional, violação dos direitos humanos, banalização e pouca valorização da vida. Outros mais poderiam ser listados. A violência é um problema da sociedade, que desde a modernidade o tem tratado no âmbito da justiça, da segurança pública, e também como objeto de movimentos sociais. No entanto, dois fortes motivos tornam o assunto preocupação da área da saúde. Primeiro, porque, dentro do conceito ampliado de saúde, tudo o que significa agravo e ameaça à vida, às condições de trabalho, às relações interpessoais e à qualidade da existência, faz parte do universo da saúde pública. Segundo a violência, num sentido mais restrito, afeta a saúde e frequentemente produz a morte. Em uma sociedade esvaziada de valores, de solidariedade, de espírito de amizade, que fomenta excessos de violência, banaliza o sexo e a agressão, o que podemos esperar? O ser humano é um ser pensante. E pensar é reformular e assumir o compromisso que se tem não só com o individual, mas também com o coletivo. Pensar é se responsabilizar na reformulação de condutas próprias e do convívio social. Diante da complexidade desse fenômeno, a partir de qualquer ângulo que seja abordado, as ações precisam envolver diferentes contextos e contar com a participação de todos. Mudar o quadro de violência que assola nossa sociedade e o mundo, implica primeiro mudarmos individualmente através do compromisso de tentarmos não ser ou não fazer aquilo que criticamos. Não nos tornarmos, por exemplo, corruptos ou corruptores, sob a justificativa de um Estado que nos desampara com um sistema corrupto ou corruptor. A psicanálise tem algo a contribuir, pois ensina que, para além da compreensão das razões e da “contabilidade” dos prejuízos verificados com a violência, falta a cada um de nós querer saber por que fazemos exatamente o que dizemos que não queremos fazer, por que repetimos o que dizemos que não queremos repetir, por que desejamos o que dizemos que não queremos desejar. Daisy Lino Psicanalista, membro efetivo do TRIEP daisy_lino@hotmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #daisylino #violenciaeresponsabilidade

  • Pessoas "perfeitas" sofrem?

    Considerando que as mínimas condições humanas estão asseguradas, como direito à moradia, alimentação e todas as necessidades básicas de sobrevivência, é muito comum pensarmos que só as pessoas que têm algum problema possuem algum motivo para sofrer. Nesse sentido, a falta de dinheiro, saúde deficitária, distância dos padrões de belezas vigentes e assim por diante, podem ser tidos como razões dos nossos infortúnios. Em razão disso, muitas vezes fazemos de tudo para chegarmos a um determinado patamar que imaginamos haver, enfim, a fórmula da felicidade. Pensamos: “não sou feliz porque ainda não cheguei lá, mas quando eu chegar...”, o que será que vai acontecer? Será que, enfim, sanaremos todos os nossos males? E, ainda por cima, seremos felizes? Não há como não pensarmos, portanto, o que entendemos por felicidade; se ela está associada com a posse de um atributo (beleza, status, condição social etc.) passaremos a eleger determinadas pessoas como possuidoras dessas qualidades que tanto almejamos: “elas são felizes porque têm aquilo que eu tanto quero!” Por outro lado, pode ser que nos identifiquemos como sendo aquela pessoa “perfeita”, porque reconhecemos nossas vantagens sobre os outros ao nosso redor. Neste caso, a questão que pode chegar é: “se eu supostamente tenho tudo, por que ainda assim sofro?”. Percebemos que há algo errado, porque a nossa equação, que centrava a posse de algo como sinônimo de felicidade, não se aplica nesse caso. Entendemos, dessa forma, que pessoas “perfeitas” precisam constantemente sustentar um lugar onde nada pode falhar. E, ainda por cima, devem, aos olhos de muitos, se sentir culpadas quando algo não vai bem, como se não tivessem o direito à reclamação, à inquietação, ao questionamento do seu modo de vida, por exemplo, ou a qualquer coisa que pudesse as retirar do seu lugar privilegiado; afinal, deste lugar elas responderiam à esperança de felicidade de muitos. Será que podem ousar questionar os padrões de felicidade vigentes? Um bom exemplo disso são os famosos tão lindos, tão bem-sucedidos e que pareciam ter “tudo”, mas quando muitos deles expõem as suas vidas particulares, para além das telas, revelam muitas banalidades, e às vezes alguns horrores, da vida comum que dizem respeito a todos nós e que ninguém está imune. Um exemplo que atualmente temos visto, muitas vezes em tempo real, são os escândalos do ex-casal Johnny Depp e Amber Heard sendo expostos nos seus detalhes mais íntimos, muito além da imagem que acreditávamos que eles possuíam. Quantos de nós ficaram surpresos com tantas revelações! O perigo, portanto, é acreditar corresponder a um ideal que os outros criaram para nós sem ousar quebrá-lo, mesmo que isso cause indignação daqueles que acreditam que pessoas afortunadas não têm problemas. Afinal, ser perfeito é sempre em relação a algo, nunca um valor absoluto. Fabiana Sampaio Pellicciari psicanalista membro efetivo do TRIEP fabiana.pellicciari@gmail.com #psicanalise #psicanalistasjundiai #psicanalisejundiai #triepjundiai #triep #fabianapellicciari #pessoasperfeitas #sofrimento #imperfeicao #felicidade

  • Cada um no seu retângulo

    A cada produto que surge em decorrência do avanço tecnológico, nos espantamos. Foi assim, por exemplo, com o surgimento do cinema, da televisão, da internet, das telas de cristal líquido, do metaverso... Num misto de horror e fascínio, nos colocamos quase paralisados frente às inovações. O horror nos impede de dizer, nos torna emudecidos e incapazes de simbolizar as experiências. De outro lado, o fascínio também impede que a palavra circule, tamanho investimento feito no objeto. Silenciamo-nos perante suas maravilhas, perdemos a expressividade frente a tanto encantamento. Enquanto o primeiro nos paralisa, o segundo nos coloca em estado de servidão. Não podendo renunciar aos benefícios e vantagens que a virtualidade nos oferece - sendo ela um operador dos processos subjetivos e elemento constituinte da cultura - como podemos nos apropriar dela sem sermos apropriados por ela? Dentre questões envolvendo o modo como o sujeito se relaciona com os formatos digitais e o modo como isso interfere em sua constituição subjetiva, estão as preocupações com as intoxicações eletrônicas apresentadas nos períodos iniciais da vida de uma criança. A intoxicação eletrônica em crianças se apresenta quando, ao invés de brincar, conversar, interagir, questionar, demonstrar sua curiosidade, explorar os espaços nos quais ela se insere, observar seu entorno demonstrando interesse para com ele, colocar seu corpo em interação com tudo isso, ela fica desconectada disso e se volta apenas ao espaço de uma tela na palma na mão. Ainda que um mundo de infinidades se ofereça ali, uma vez aberta uma janela, se abrirá sempre e quase a mesma janela (bolhas algorítimas), numa infinidade também de repetições e tiktoks, dos quais, o sujeito, em constituição e formação psíquica, torna-se também um eco. Em consequência disso, a criança começa a perder seu interesse pelo outro e pelo mundo à sua volta, deixa de compartilhar experiências, diálogos e brincadeiras, subtrai seu corpo de modos de interação e vai se inserindo cada vez mais num universo que limita suas possibilidades de atribuição de sentido, de fantasia e de elaboração subjetiva das experiências e situações vividas, trazendo prejuízos à criatividade e ao pensamento. Os efeitos destes modos de relação com celulares, tabletes, ipads, telas, telas e telas, se inscrevem no psiquismo da criança e afetam seu modo de se subjetivar e de se relacionar com o outro, trazendo, em decorrência, quadros sintomatológicos que impactam tanto a criança quanto a sociedade e a cultura da qual ela participa. São sofrimentos que remetem à depressividade, agressividade, estados intensos de agitação, dificuldades de aprendizagem, transtornos de atenção e concentração, demandas de consumo, autistização... todos, de alguma forma, trazendo uma tentativa de configuração do desamparo ao qual a criança se vê submetida em decorrência de seu isolamento virtual. Diante desse cenário, precisamos repensar qual o lugar que temos destinado à criança em nossa cultura. Para o filósofo Giorgio Agambem, a infância é o lugar da experiência, por excelência. E essa experiência, se não for ensinada, transmitida, passada nas trocas humanas, torna-se perda e ausência. Na mesma linha de pensamento, a psicanalista Julieta Jerusalinsky afirma que “a gente precisa de gente para virar gente, pois é na relação com o outro que uma criança se estrutura.” Nesse cenário em que o predomínio e o excesso de imagem e de virtualidade se impõem, sem a presença efetiva do outro, acompanhamos o apagamento do sujeito e os efeitos nocivos à sua subjetividade desde os períodos iniciais de sua constituição. E se assim tem sido, é hora de trazer os adultos de volta pra sala! Leila Veratti Psicanalista, membro efetivo do TRIEP leilacsantos@hotmail.com #intoxicacoeseletronicas #infanciaeinternet #psiquismoeinternet #virtualidadeesintomatologia #subjetividadeeinfancia

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